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Quando a Cultura é o mais Importante

Quando a Cultura é o mais Importante

O que se entende quando falamos de cultura em um ambiente hospitalar?

Referimo-nos a atitude de indivíduos, grupos e de todo conjunto do agrupamento entre eles.

Definimos a melhor cultura como aquela atitude : justa, horizontalizada e transparente.

Talvez, a pior cultura seja aquela onde as pessoas pensam que tudo seguirá igual, não importa o que aconteça, nada vai mudar nem melhorar, não importa o que você faça.

Deveríamos classificar ao menos dois tipos de cultura: as centradas em poder e as centradas em valores.

As centradas em poder, ou seja, muito hierarquizadas ou verticalizadas, normalmente configuram um ambiente de medo. As pessoas operam com forte incidência de medo da autoridade e suas consequências.

As centradas em valores, por outro lado, são mais horizontais, pois não há uma excessiva gama de autoridade entre um operador e outro. Centrado (concentrada) nos valores, quer dizer que deve existir a justiça atuando para respaldar os mesmos. As regras também formam parte de um sistema de valores.

Por que é disfuncional ter uma cultura de poder dentro de um ambiente hospitalar?

Diversos autores definiram o ambiente hospitalar como um sistema complexo. O que é um sistema complexo?

Um ambiente complexo é um entorno, onde existem várias ações ou “drivers” que promovem ações que geram reações. Não existe uma relação direta, de causa e efeito, entre eles, nem entre eles e suas reações ou consequências. Às vezes as reações são desproporcionais as mudanças nos drivers. Não é que existe um caos, existe outro tipo de ordem, não direto, não linear.

Num sistema complexo temos fatores inibidores atuando e preservando o sistema e também catalizadores, ou seja, fatores que promovem a mudança, que podem ser estimulados.

Temos drivers que, pela ação de outros, são realimentados positivamente e outros que são alimentados negativamente. Não existe a proporcionalidade das consequências.

Existem também atrativos, ou seja, elementos como a força da gravidade que mantém sua influência sempre e em qualquer situação.

Não sabermos como funciona um sistema complexo, não quer dizer que seja caótico. Somente que a regra de 1 + 1 = 2 não funciona. O pensamento linear não nos ajudará, uma lógica relacional ou relativa, onde não existe o certo absoluto, nem errado absoluto, nos guiará melhor.

Haverá muitos casos de resultados paradoxais. Simplesmente são aqueles cuja lógica ainda não entendemos, não por isso, menos lógicos.

 

Um hospital tem, pela integração em um ambiente humano, ambiente tecnológico, interesses particulares e enfermos, uma característica do sistema sócio complexo. Mas isso não quer dizer que não tenha que realizar também muitas operações com uma sequência determinista de uma operação militar. Esse último deve funcionar nas tarefas de logística, limpeza, produção, administração, etc.

Para todas aquelas operações onde é necessária a participação de várias pessoas e critérios, na hora de tomar decisões, uma cultura baseada em valores se destaca sobre uma cultura apoiada em poder.

O gradiente de autoridade. Na indústria de aviação, depois de comprovar que em alguns acidentes o copiloto não teve coragem de dizer ao comandante que havia um erro no procedimento e isso os levou a um desastre, começou-se a treinar o pessoal de forma conjunta e não separada. Avaliou-se a capacidade de comunicação dos integrantes do equipamento e estimulou-se que eles se comunicassem, reduzindo a gradiente de autoridade, que impedia que uma pessoa de menor nível dentro do grupo comunicasse um incidente importante ao líder.

Uma cultura horizontalizada não quer dizer totalmente horizontalizada. Não é uma democracia, onde se vota um procedimento. É uma cultura onde uma auxiliar pode informar a um grande cirurgião que houve um desvio ou erro no procedimento. Mas seguimos necessitando dos líderes, ainda em situações onde se impera o complexo. É uma boa prática que as soluções sejam buscadas organicamente em pessoas especialistas, com conhecimento e habilidades e não na cadeia de mando, ou seja, nos chefes.

Uma boa cultura se nutre de transparência. Para existir uma cultura baseada em valores, todos devem ter acesso a informação, com grande transparência. A transparência é a ética do século XXI. Os sistemas são mais complexos que antes e requerem a participação e colaboração de todos para diminuir erros.

Muito se fala da cultura de culpabilidade, ou seja, aquela que culpa as pessoas pelos erros ao invés de buscar as falhas que existem dentro do sistema. Com poucas exceções, as falhas são sempre causadas por um sistema com erros ou pouco seguro.

A anomalia da cultura baseada em poder, dentro dos sistemas complexos, está em que as decisões em grupo, em concordância com diferentes especialistas e pontos de vista, é absolutamente necessária para o êxito. Uma solução simples ou simplista é por definição uma resposta errada a um problema complexo. É necessário cavar mais profundamente, a solução deve considerar, ao menos, o mesmo nível de complexidade que o problema.

Os seres humanos são seres que erram e o desenho de qualquer sistema deve realizar-se tendo isso em mente e prevenindo as consequências, para quando os erros naturais acontecerem.

Leva muito tempo para mudar uma cultura, pois há muitas mentes e recordações envoltas nesta mudança, mas é um dos fatores com maior incidência de resultados. A mudança das tecnologias ajuda, mas por si só não realiza toda a evolução necessária.

Victor Basso
Diretor de Opuspac Ltda.
Opuspac University (universidade corporativa – braço educacional da Opuspac Ltda)